MANIFESTA LÉSBICO-FEMINISTA
Nós, lésbicas e mulheres bissexuais potencializamos o momento de isolamento social em processos de formação política e acadêmica nos estudos das teorias lésbicas feministas, das lesbianidades e interseccionalidades. Por isso, escrevemos em coletividade essa manifesta, como reivindicação e proposta de um mundo não heteronormativo, não lesbofóbico, anticapitalista, antirracista, antixenofóbico, anticlassista e anticapacitista. Utilizamos a categoria “lésbica” enquanto um posicionamento político para além de uma orientação sexual, incluindo mulheres bissexuais e/ou mulheres que se identificam com mulheres afetiva, sexual e politicamente e que estejam engajadas com a transformação social.
Compreendemos que as pessoas podem ser o que quiserem, mas não é bem isso que a sociedade ainda baseada em preceitos patriarcais, racistas e misóginos apresenta. Consideramos que as pessoas devem ser livres das amarras da heteronorma, por isso, acreditamos em uma sociedade onde:
Todas as lésbicas e mulheres bissexuais, independente de raça/etnia, gênero, classe, escolaridade, geração, deficiências e orientação sexual têm a liberdade de ser o que quiserem, se relacionar, constituir famílias, ou não, mas essas existências devem ser respeitadas. Assim como, o Estado deve garantir políticas públicas que incluam as especificidades, sem enquadrar todas as pessoas como heterossexuais, especialmente, quando não se performativa os papéis de gênero, ainda impostos.
Lutamos pelo reconhecimento da nossa existência, onde as práticas lésbicas não dizem simplesmente do campo do “privado” das relações sexuais, mas de uma visão da sociedade em que nossos corpos questionam a heteronormativade, seus requintes de crueldade, baseados nas relações de parentesco e da propriedade privada, especialmente.
Independente da condição sexual, racial, étnica, de geração, classe, de performance de gênero, somos políticas que construímos com nossa forma de estar no mundo, com questionamentos necessários para o respeito às expressões de nossas sexualidades. Somos símbolos de existência e resistência!
Questionamos as normas e nossos corpos não serão mais silenciados! Assim como as nossas escritas” Nós existimos e resistimos!
Aqui reverenciamos mulheres que vieram antes de nós e pensaram uma epistemologia lésbica feminista, radical e política de transformação da sociedade: Safo, Adrienne Rich, Monique Wittig, Gayle Rubin, Jules Falquet, audre lorde, Cheryl Clark, dentre tantas outras.
Nossas saudações a todas que constroem suas experiências para a epistemologia lésbica feminista, antirracista e de transformação da sociedade. //
Através desta manifesta, evidenciamos todas as formas de expressões das lesbianidades como um dos elementos na nossa formação política, acadêmica e pessoal.
Nós temos o direito de expressar nossas sexualidades, independente da fase que aconteça. Para isso se faz necessário uma educação sexual nas famílias, nas instituições públicas e privadas, que reconheçam e respeitem as orientações sexuais, para além da heteronormatividade.
Temos ciência das atrocidades que ainda persistem em nossa sociedade, quando vemos nossas irmãs sendo oprimidas e violentadas, dói em nossos corpos, porque muitas vezes somos estas irmãs. Estamos sempre sentindo como é viver numa sociedade na qual somos vulneráveis, apesar de muito fortes. Lutamos por aquelas que precisam de nós, porque antes tiveram aquelas que lutaram por nós, com um pensamento amparado nelas seguimos, como audre lorde diz: “Eu não serei livre enquanto houver mulheres que não são, mesmo que suas algemas sejam muito diferentes das minhas”. Esta manifesta também é um chamado para que mais mulheres se incluam na luta, independente do lugar de fala, para transformação da sociedade.
O amor entre mulheres é uma potência que transforma nossas existências, que em meio as nossas complexidades, singularidades, somos resistentes e desafiamos cotidianamente a proibição institucionalizada do amor entre mulheres.
Compreendemos que esta manifesta parte de uma educação questionadora e transformadora que contemple nossas pluralidades. Reivindicamos uma educação antirracista, anti-LGBTfobia, anticapitalista. Uma educação interseccional que leve em consideração as questões ambientais, os saberes tradicionais de terreiros, aldeias e quilombos.
Compreendemos que muito se avançou, no entanto, precisamos deixar evidente que existe um fazer epistêmico lésbico e político, que precisa sair das gavetas dos gabinetes, dos repositórios e ganhar o mundo, as ementas. Nossas produções tem um ponto de vista lésbico feminista, interseccional, antirracista, sobretudo, temos o compromisso político da geopolítica, de evidenciar nossas publicações e deixar nítido que não se trata “apenas” de uma relação sexual que vai passar, porque tem o mito que seremos salvas pela heteronormatividade. Não precisamos de salvação! Somos militantes, pesquisadoras, comprometidas a analisar a sociedade a partir das sexualidades, dentre ela, as lesbianidades, a partir dos pontos de vista lésbico feminista, sapatão, interseccional, antirracista.
Vamos ler teóricas lésbicas nas universidades brasileiras, latinoamericanas, dos movimentos. Leiam as lésbicas que escrevem sobre lesbianidades em suas diversas expressões. Optamos por finalizar essa manifesta com um trecho da poesia de Raquel Berenguer intitulado “Espalhando Sementes”, como um convite a todas as lésbicas, mulheres bissexuais e das diversas de lutas. Juntem-se a nós e vamos construir mais resistências, epistemologias, atos políticos e revolucionários do amor entre mulheres, em suas diversas esferas.
“Assim, quem sabe um dia juntem-se
a nós mais duas mulheres,
que semeiam,
mais dez mulheres,
que plantam,
mais cem mulheres,
que colhem.”
06 de dezembro de 2020