É Carnaval, mas não vale violar direitos humanos! Nota dos grupos Jusfemina e Gira da UFBA sobre direitos humanos no carnaval
É CARNAVAL, MAS NÃO VALE VIOLAR DIREITOS HUMANOS!
É carnaval e a folia nos convida a brincar, a interagir e a socializar, pois se trata de um momento de extrema alegria, de descontração, de transbordamento de energia, de criatividade e de felicidade intensa. Por isso, é uma boa hora para celebrar a diversidade, sem deixar que as desigualdades sejam aprofundadas ou estimuladas através de segregações ou violações dos direitos humanos.
Respeito é a palavra de ordem. Tanto é que alguns governos adotam campanhas educativas em prol dos direitos de grupos socialmente excluídos e/ou discriminados como mulheres, indígenas, negros, LGBTQI+, dentre outros.
Porém, infelizmente, a cada ano muitas pessoas, dentre elas artistas famosos, costumam, “ainda que sem querer”, protagonizar situações no mínimo desagradáveis, tais como usar fantasias que contribuem para o reforço do racismo, do patriarcado, da LGBTfobia e de outras formas de discriminação e opressão.
Por isso, nunca é demais lembrar que a identidade cultural, étnico/racial, de gênero, territorial, linguística ou mesmo religiosa não é fantasia de carnaval, pois quando pessoas, sobretudo brancas, pintam seus corpos de negro ou usam blackface, estão alimentando o racismo, afinal, a cor da pele de outra pessoa não deve ser tomada como fantasia de festa, principalmente quando se trata de um grupo que sofre exclusão baseada neste fator. É como o “brincar de índio” que também não tem a menor graça, pois se trata de caricaturar uma identidade, de desrespeitar grupos que lutam historicamente por se fazer reconhecer como sujeitos de direitos, dentro de suas especificidades, particularidades e diversidades.
Do mesmo modo, cair na folia com roupas típicas de algum grupo ou segmento religioso, tais como praticantes das religiões de matriz africana ou mesmo cristãos tradicionais, também não é razoável e muito menos engraçado, mesmo que alguns considerem que “faz parte da festa”, pois as pessoas que são apontadas socialmente como “macumbeiras” ou como “crentes”, em virtude de suas roupas e/ou adereços caracterizadores de suas orientações religiosas, talvez não se sintam confortáveis vendo que são ridicularizadas naquilo que para elas é a forma de expressar sua condição, sua fé ou mesmo os valores que carregam em virtude de suas tradições.
Como saber, então, se a fantasia que vamos usar reforça ou não a intolerância contra determinados grupos ou sujeitos socialmente excluídos, discriminados e/ou vulnerabilizados?
De nossa parte, acreditamos que não há uma receita, até porque muitas destas práticas não são consideradas crimes, mas, talvez um bom começo seja refletir sobre a diversidade humana e exercer a empatia, isto é, se colocar no lugar do outro ou da outra para perceber se estamos equivocados/as ou não em nossas escolhas. Afinal, quem de nós nunca cometeu algum erro, nunca incorreu em equívocos ou nunca ofendeu alguém mesmo sem querer ou mesmo se dizendo defensores/as da diversidade social e humana? Quem de nós nunca deu um close errado até que alguém nos deu um toque ou fomos questionados por algum movimento social? Quem de nós nunca foi contaminado pela cultura hegemonica, que não respeita ou não tolera as diferenças? Quem de nós não está em permanente desconstrução?
Sendo assim, é importante que estejamos abertos/as para observar e aprender. Pois é possível que tenhamos alguém em nossa família ou entre nossos amigos que faça parte de algum grupo social que não gostaria de se ver representado como fantasia de carnaval, sendo objeto de chacota no meio da multidão. Não custa nada perguntar. Quem sabe ele ou ela nos ajude a enxergar o nosso equívoco e a nos divertir sem ferir ninguém e sem usar justamente aquela “fantasia” que constitui um traço da sua identidade social, enquanto indivíduo ou grupo historicamente discriminado, excluído e, portanto, segregado ou ridicularizado.
Afinal, carnaval combina com o sensual, mas não rima com violação de direitos ou intolerância à diversidade, não é verdade?
Pensemos nisto! E se você vai pra folia, divirta-se a valer e seja muito feliz! Viva e deixe viver! Mas não discrimine, não viole direitos. Ria de alegria e não da dor alheia. São os votos dos grupos de pesquisa Jusfemina e Gira da Universidade Federal da Bahia.
P.S: Aproveitamos o ensejo para indicar a leitura do cordel “Porque todo não é não”, da professora Salete Maria da Silva, escrito para esse carnaval. Disponível em: <http://cordelirando.blogspot.