A obstetrícia enquanto campo científico, a ciência na formação dos médicos obstetras e na produção da noção de corpo e de mulher

Maria Santana

Abrangendo um projeto maior, a escrita de uma tese a partir de um trabalho de campo com solidez e profundidade, esta apresentação objetiva realizar uma discussão bibliográfica acerca dos estudo sobre a ginecologia e a obstetrícia enquanto ciência e prática de cuidado, tomando como foco de análise o processo de formação do profissional em obstetrícia e olhando para a maternidade escola não como unidade discreta, mas a partir dos fluxos que o recortam e que se apresentam como cada vez mais importantes para entender questionamentos atuais sobre ciência, tecnologia, saúde da mulher, práticas terapêuticas e de cuidados, violências, razão de morbimortalidade materna e infantil, e principalmente, a noção de corpo, pessoa e mulher na sociedade ocidental contemporânea. Compreender esse objeto particular, a obstetrícia, supõe refletir sobre uma diversidade de questões que suscitam debates teóricos específicos, tanto quanto debates mais gerais, sobretudo em face das temáticas do estudo dos campos científicos, da tecnologia, das praticas pedagógicas, da produção de verdades a partir da ciência e da validação do discurso e da prática médica obstétrica, bem como da articulação entre saúde da mulher, reprodução e controle social. Olhar para a obstetrícia é também olhar para o parto e sua natureza social, mas também orgânica, fisiológica, e, assim, considerar a própria noção de corporeidade e para todo um emaranhado de práticas, discursos, imaginários e representações que impregnam a noção de corpo na modernidade. O hospital aparece, então enquanto instituição socializante fundamental, visto como dispositivo essencial para a produção e transmissão de conhecimento, e para a disciplinarização dos corpos. Para tratar desta temática trago autoras como Martin (2006), Foucault (1979; 1991), Le Breton (1995), Bonet (1999), Rohden (2001), Diniz (2005), Strathern (1995) e Haraway (2009). Franklin (1995) e Bordo (1986) e Moscucci (1996) apontam para a constituição da ginecologia e da obstetrícia como ferramenta e ao mesmo tempo produto de uma separação do eu do corpo e também do corpo social, bem como da distinção e hierarquização entre mulheres e homens. Elas despontam como referenciais importantes para análise da construção do saber e da prática obstétrica, da construção de um quadro de verdade sobre a mulher, seu corpo, corporeidade e sexualidade baseado no discurso racional e científico, para a compreensão das transformações da noção de pessoa e de mulher na sociedade contemporânea. No que diz respeito a uma teoria mais geral, é possível destacar a contribuição de autores como Latour e Woolgar (1997), Lynch (1990) e Hess (2001), que tratam das pesquisas sobre ciência e tecnologia no contexto dos laboratórios e das práticas científicas. Com sua noção de coletivo como produções de natureza-cultura, Latour (1994) reestabelece a interligação entre objetos geralmente tratados de maneira separados, indo um pouco além da problematização da dicotomia entre mundo natural e mundo social, possibilitando uma antropologia simétrica que investiga e compreende a um só tempo práticas, conhecimentos e poderes. É possível recorrer tanto a Latour (2001) quanto a Stengers (1993) para tratar das estruturas hierarquizadas, da produção de verdades e da disputa por legitimidade e poder que envolvem as práticas científicas. Isto, a partir da ideia de rede e de associação desenvolvida pelo primeiro, possibilitando compreender que as redes científicas não apenas extrapolam as paredes do laboratório como trazem o mundo para dentro dele. É também neste sentido que Franklin (1995) defende uma perspectiva em que laboratório e sociedade interajam na produção do real, ou no caso desta pesquisa, não apenas laboratório, mas também o espaço da maternidade escola a ser estudado.


Fórum Gira: Encontro de Pesquisadoras e Pesquisadores do Grupo de Estudos Feministas em Política e Educação da UFBA
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